the heart companion
27.05.2009 - 27.05.2010
que a vida é imprestável e a poesia para nada serve, já ambos o sabíamos.
conhecíamos de cor os fados todos - à cabeça, os mais sombrios -
e Fátima ficara lá para trás, havia já muito tempo.
agarrados ao futebol e á língua franca em que agora escrevinhamos
estes versos - torpes, brancos-detergente, pobres -
nada nos preparara, contudo, para essa quase noite de cinzas.
de um lado, a poderosa armada britânica, ostentando o título
(todos os títulos passados e futuros - 'in my dreams' - e mais alguns);
do outro, a esquadra 'contender', capitaneada por um rapaz baixo,
promitente herdeiro alvi-celeste dessoutro deus, Dieguito de seu nome.
sentados desajeitadamente no sofá, a luz da tarde a esvair-se,
misturávamos Português, Inglês e Alemão, numa cacofonia irrepreensível
(semiótica pura e sinal dos tempos - Erasmus na Torre de Babel).
na televisão, o nosso príncipe quase perfeito afundava-se,
com aquele espanto próprio dos que se julgam omnipotentes
- o príncipe e toda a sua ínclita e mui britânica geração.
disfarçavas, amigo meu, o melhor que sabias, o melhor que podias,
o abismo que me abraçava, os fantasmas nas vidraças, os abutres à espreita.
por entre minis mal bebidas, o sabor amargo das minhas lágrimas
era já, como dizer, o tom dominante, anunciando impiedosamente
mais uma balada triste, daquelas onde se misturam enxofre, melancolia,
um eterno desespero, todo o desamor do mundo.
noventa minutos, sem direito a prolongamento ou penalties,
uma derrota sem redenção (se fora boxe, dir-se-ia por knock-out),
a súbita máscara da dor, irmanando, em cores baças,
aqueles onze guerreiros do apocalipse moderno, em calções,
tu, meu amigo, fazendo das tripas coração por mim (eu sei que sim),
e eu, perdido em campo, perdida mais uma vez a vida feliz,
chorando a distância obscena que vai das honrarias ferrugentas
ao ferrete interno de nos saber eternos 'has been'.