- shall we never sink alone -

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quinta-feira, 24 de setembro de 2009

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o meu mundo tem estado à tua espera; mas

não há flores nas jarras, nem velas sobre a mesa,
nem retratos escondidos no fundo das gavetas. sei
que um poema se escreveria entre nós dois; mas
não comprei o vinho, não mudei os lençóis,
não perfumei o decote do vestido.
se ouço falar de ti, comove-me o teu nome
(mas nem pensar em suspirá-lo ao teu ouvido);
se me dizem que vens, o corpo é uma fogueira –
estalam-me brasas no peito, desvairadas, e respiro
com a violência de um incêndio; mas parto
antes de saber como seria. não me perguntes
porque se mata o sol na lâmina dos dias
e o meu mundo continua à tua espera:
houve sempre coisas de esguelha nas paisagens
e amores imperfeitos – Deus tem as mãos grandes.

..

diz-me o teu nome — agora, que perdi

quase tudo, um nome pode ser o princípio
de alguma coisa. escreve-o na minha mão

com os teus dedos — como as poeiras se
escrevem, irrequietas, nos caminhos e os
lobos mancham o lençol da neve com os
sinais da sua fome. sopra-mo no ouvido,
como a levares as palavras de um livro para
dentro de outro — assim conquista o vento
o tímpano das grutas e entre o bafo do verão
na casa fria. e, antes de partires, pousa-o
nos meus lábios devagar: é um poema
açúcarado que se derrete na boca e arde
como a primeira menta da infância.
ninguém esquece um corpo que teve
nos braços um segundo — um nome sim.



maria do rosário pedreira


o teu nome é já poeira sideral, uma constelação de estrelas a caminho da morte, um jogo de espelhos que engana os sentidos. o teu nome é já um galgo a quem cortaram as pernas, correndo desvairado a caminho da aniquilação. o teu nome é sangue decomposto - plaquetas, glóbulos, conjunto de fenómenos químicos passíveis de análise laboratorial. o teu nome são rosas mortas, petrificadas sobre a mesa que ninguém frequenta já. o teu nome é um território amaldiçoado, uma heresia contra a beleza selvagem que nos enche de júbilo e esmaga o cinzento baço de um céu de meteoritos. o teu nome é um rótulo, uma palavra desgraçada que lembra todas as curvas do teu corpo. e esse cheiro doce que, viva cem anos ou nenhum, não mais esquecerei. o teu nome é um fogo-fátuo, fenómeno meramente geológico, próprio dos cemitérios esquecidos.

o teu nome é uma flor indelével. um universo inteirinho. Deus a brincar aos sonhos.

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